quarta-feira

Corrija-se



Fala-se muito de preconceito, em especial, nas formas de preconceito racial, social e sexual, mas há um tipo de preconceito que é muito comum, o praticamos desde criança e não nos damos conta disso.

Quando crianças, cansamos de rir dos amiguinhos que falam algo errado, dependendo do seu modo de falar é tachado de caipira, às vezes dentro da sala de aula diante dos professores, outras vezes na rua ou em casa mesmo.

Por muitas pessoas não ligarem, ou terem conhecimento, continuamos com esse comportamento pela vida afora, podendo muitas vezes sermos repreendidos, mas poucas ou nenhuma vez alguém nos diz que estamos praticando um tipo de preconceito, o preconceito linguístico.




Preconceito Linguístico é quando não toleramos o falar diferente das pessoas e fazemos piadinhas, desdenhamos ou rotulamos as pessoas por causa disso.

Uma cena muito comum é essa:


Estava na casa de um amigo, assistindo TV, quando aparece um senhor conversando com sua filha, via-se que era de origem humilde e pouca instrução escolar, ele usa uma palavra considerada errada por meu amigo, que então dá uma risadinha com ar de desdém. Perguntei a ele o porquê daquilo e ele me disse: pô Joakim o cara nem sabe falá direito. Eu disse que se ele ouvisse a gente falando, diria a mesma coisa. ( Sim, somos paulistanos).

No Brasil há uma coisa maravilhosa, falamos diferentes sotaques, dialetos, mas uma só língua, nos entendendo perfeitamente em qualquer lugar do nosso país. Mesmo assim muitos confundem gramática normativa com a língua. Se, no intuito de aprender, juntássemos todos os dicionários de português e decorássemos todas suas palavras, ainda assim, faltaria um sem número delas.

A língua é viva e assim sendo, se transforma.

Se observarmos bem, o preconceito linguístico também pode se transformar em um preconceito social, onde os mais ricos zombam dos mais pobres que não tiveram acesso a melhores formas de estudo, ou pior, a qualquer estudo.

Não notamos, mas a cada deboche, podemos fazer com que algumas pessoas deixem de acreditar em si mesmas, elas vão ficando cada vez mais longe do seu tão sonhado grito de liberdade. Quem não viu, nem que seja retratado em uma novela, peça, filme, o empregado que o patrão lhe dá conselhos para ir em frente e ele responde, isso ai não é pra mim não patrão, isso é pro senhor que é dotô. Vemos facilmente pessoas falando assim por aí e muitos apenas riem deles.

Cada vez mais eu sei que tive a sorte de crescer em um solo fértil, onde a semente cresceu ouvindo cantigas e histórias antigas, da boca de pessoas que fazem macarrão no aí e ói e pedem para comprar fosco quando acabam. Isso me leva a pensar em quantos doutores podemos ter perdido, quantas histórias deixaram de ser contadas, poemas admirados e músicas cantadas.

Que tal pensarmos em nos corrigir um pouco também e ficarmos de olho em nossas ações, pois podemos estar perdendo ótimas histórias, contadas por pessoas que falam assim:


Samba do Arnesto
(Adoniran Barbosa)

O Arnesto nos convido prum samba, ele mora no Brás
Nós fumos não encontremos ninguém
Nós vortemos com uma baita de uma reiva
Da outra vez nós num vai mais
Nós não semos tatu!
No outro dia encontremo com o Arnesto
Que pediu descurpa mais nós não aceitemos
Isso não se faz, Arnesto, nós não se importa
Mas você devia ter ponhado um recado na porta
Um recado assim ói: "Ói, turma, num deu pra esperá
Aduvido que isso, num faz mar, num tem importância,
Assinado em cruz porque não sei escrever

Arnesto

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